O apagar das luzes

Corria o final do século XIX no Japão. Em 1868 houve a Restauração Meiji, com o retorno do poder ao imperador. Com o fim da classe feudal dos senhores da guerra, a utilização de guerreiros particulares caiu em declínio em prol de um exército unificado, com influência militar do Ocidente. Em 1871 um decreto imperial abolia o uso das duas espadas, símbolo máximo dos Samurais. Isso causou uma comoção nacional. Muitos Samurais praticaram o seppuku, a morte ritual (incorretamente chamada de hara-kiri no Ocidente), enquanto outros se tornaram artesãos, pescadores ou comerciantes. Mas uns poucos não conseguiram abandonar as artes marciais.

Na época do decreto que aboliu as espadas, muitas escolas de artes marciais não agüentaram a falta de alunos e fecharam. Incontáveis estilos que existiam naquela época (alguns autores mencionam cerca de 400 estilos, embora vários sejam similares, mudando apenas o nome) desapareceram, levando consigo preciosos segredos das artes marciais. Mas o antigo estava definitivamente fora de moda, pois a população buscava freneticamente os costumes e tecnologias do Ocidente, particularmente a Europa.

Em meio à essa onda avassaladora, sem trabalho e com sua arte desacreditada, muitos experts em Jujutsu se meteram em brigas de rua e arruaças, denegrindo o bom nome da arte. Logo o têrmo “jujutsu” era sinônimo de baderneiro e encrenqueiro. Muitos mestres juntavam seus adeptos em turmas e lançavam desafios abertos, organizando lutas remuneradas, que geravam combates encarniçados pela “supremacia” técnica. Nesse quadro caótico, onde as raízes estruturais das artes marciais japonesas estavam abaladas e ameaçavam ruir, surge um homem com uma visão diferente, moderna, embora dotado do saber ancestral: Jigoro Kano.